quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Guiné morre pela água, é barato mudar situação

 Banho em Saltinho 103 (Large) A Guiné-Bissau morre pela boca. A água que bebem os habitantes da antiga colónia portuguesa provém de poços contaminados, muitos deles pagos com doações de países ricos. Cientistas portugueses estão desde 2006 a estudar como mudar o panorama.

A má qualidade da água, altamente contaminada com fezes  e parasitas, está a comprometer o futuro de um país que fica a quatro horas de avião de Lisboa, porém a muitas décadas de desenvolvimento civilizacional. Lá, as crianças ainda morrem de diarreia, as mulheres têm uma média de 22 filhos e a esperança de vida não passa dos 46 anos.

Adriano Bordalo e Sá, do Laboratório de Hidrobiologia do  Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar (ICBAS), no Porto, conhece bem a Guiné-Bissau. Desde 2006, passa  temporadas no país, tentando criar uma base científica para "encontrar formas sustentáveis de resolver o problema da água".

No domingo, voltou a viajar. Com ele, partiu outra hidrobióloga do ICBAS, Ana Machado, doutoranda com um projecto sobre a cólera financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, e ainda a filha do cientista, Joana Bordalo e Sá, médica oncologista que investiga a deficiência da população em iodo.

A equipa começou por ir voluntariamente e ainda faz muito trabalho nesses termos. As descobertas têm sido alarmantes. Uma delas é que a cooperação internacional, incluindo as Nações Unidas, paga a construção de poços onde se acumula água muito poluída. " Um poço num país com as características da Guiné-Bissau é um presente envenenado", declara o cientista.

São escavados no máximo a 20 metros de profundidade e para eles escorre toda a porcaria, num país onde pessoas e animais defecam ao ar livre, os porcos chapinham na água junto aos poços e há seis meses de chuva intensa. Nesses poços, a equipa do ICBAS encontrou ratazanas, bactérias e vírus (muito à vontade numa água que chega aos 31 graus) e um grau de acidez próximo do limão.

Muito diferente seria se, em vez de poços, os guineenses pudessem tirar água de furos, cuja profundidade vai além de uma camada de argila impermeabilizadora que contém as águas pluviais."Há mais de seis mil poços na Guiné. É o mais barato e mais fácil de construir", refere.

A ONG espanhola AIDA provou que os furos podem ser uma solução - com financiamento de 100 mil euros, doados pela Junta Autónoma da Galiza, construiu uma rede de fontanários nos bairros de Bolama, captando água em furos. "A incidência de diarreia desceu para metade", conta Bordalo e Sá.

"Não é preciso muito dinheiro para melhorar a qualidade de vida das pessoas na Guiné", sublinha o cientista, lamentando que a ajuda internacional não recorra aos dados científicos apurados para tomar decisões fundamentais, algumas delas fáceis de executar.

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