domingo, 4 de abril de 2010

Guiné-Bissau: O regresso ao paraíso do narcotráfico



Bissau – As declarações do Presidente guineense e as garantias do Chefe do Executivo não convenceram a comunidade internacional. Com o golpe militar desta quinta-feira a Guiné-Bissau reabriu as portas ao narcotráfico.

Solenemente, perante uma amálgama de jornalistas, o antigo fiel de Zamora Induta, Dahaba Na Walna, porta-voz do Estado-maior General das Forças Armadas, justificou as razões que levaram à detenção do deposto CEMGFA Induta.

Argumentos que não convenceram a comunidade internacional. Samba Djaló foi acusado de ter difundido através da internet uma carta que revelaria as já conhecidas clivagens no interior do PAIGC. Dahaba Na Walna realçou também o papel de «vítima» de Bubo Na Tchuto o qual é qualificado na edição de hoje, 03 de Abril, do prestigiado jornal «Le Fígaro» como o «Almirante da Coca». Paradoxalmente, enquanto realçou a presumível inocência de Bubo Na Tchuto, não se esquivou de acusar Zamora Induta de «tentativa de assassinato do vice CEMG Antonio Indjai, coronel Carlitos Cunda e do tenente-coronel Tcham Naman».

Por fim dá, também, um veredicto final quando alegou que foi encontrado, supostamente na residência de Induta, «um depósito de armas (...), com mais de 30 espingardas automáticas AKM e lança granadas». Um argumento pouco credível quando as armas proliferam na Guiné-Bissau, e muitos reputados civis possuem pequenos «depósitos de armas», devido aos receios de a todo o momento disparar uma revolta militar ou Golpe de Estado, cada vez mais frequentes no país.

Para sustentar as teses das culpabilidades de Zamora Induta e Samba Djaló começaram já a circular nas ruas da capital guineense rumores que indicam que estes dois seriam os responsáveis dos assassinatos de «Nino» Vieira e Tagmé Na Waie.

Apesar da insistência do Presidente guineense, Malam Bacai Sanha, a comunidade internacional não está convicta que a Guiné-Bissau regressou a um «Estado de Direito». O Presidente, que contrariamente ao primeiro-ministro, não foi incomodado pelos fiéis de Antonio Indjai durante o Golpe militar, escuda-se num comprometedor documento assinado a 05 de Março onde Indjai confessou a sua implicação directa numa operação de tráfico ocorrida na noite de 28 de Fevereiro para 01 de Março no aeródromo de Cufar, sul da Guiné, no município de Catio.

Na manhã de 28 de Fevereiro vários indivíduos «brancos e negros» foram vistos a transportarem combustível para o aquartelamento de Cufar, próximo do aeródromo. Por volta das 20h00 foram acesas fogueiras e militares garantiram um perímetro de «segurança» em torno da pista. Por volta das 00h30, 01 de Março, aterrou um avião, de maior porte que os precedentes em operações semelhantes, e durante uma hora foi efectuada a transferência da droga entre os veículos estacionados na pista e o avião. Por volta das 01h30 o avião descolou. A operação estava terminada. No mesmo dia, às 09:00 horas o Comissário da Policia de Catio decidiu deslocar-se a Cufar para tentar apurar alguns pormenores do ocorrido.

Através da Inteligência militar, o Presidente, primeiro-ministro e o Procurador-Geral da Republica, são informados do sucedido, mas Malam Bacai Sanha opta por desmentir o ocorrido em Cufar a fim de continuar a preservar a «boa imagem da Guiné-Bissau» face aos seus parceiros internacionais. Mesmo assim, a 03 de Março, é constituída uma comissão pelos Serviços de Informações de Estado com a missão apurar os pormenores da questão do «avião em Cufar» e apurarem o envolvimento de «altas hierarquias militares», entre os quais António Indjai que acabou por reconhecer a sua responsabilidade directa da operação de narcotráfico em Cufar.

Logo após a assinatura da confissão de António Indjai, de etnia balanta tal como Bubo Na Tchuto, foi detectada uma grande agitação no seio das forças armadas que indicavam a eventualidade de um «levantamento dos balatas no seio das FA», também acólitos do ex presidente Kumba Ialá. Uma situação que o então CEMGFA Zamora Induta tentou controlar, procurando deter e estancar a participação das hierarquias militares no narcotráfico. Mas no domingo, 07 de Março, António Indjai, apesar de estar «sob estreita vigilância» deslocara-se ao destacamento de São Domingos. A preparação do Golpe militar estava em curso, e o circulo próximo do Presidente da República estava ao corrente.

As ligações da «entourage» presidencial com o narcotráfico não são virgens. Por exemplo, o seu chefe de Gabinete defendeu na barra de tribunal guineense vários narcotraficantes sul americanos detidos no pasado em Bissau.

«Estes acontecimentos têm uma ligação directa com a droga, afirma o investigador Vincent Foucher nas páginas do Fígaro, uma vez queo primeiro-ministro e o ex chefe de Estado Maior tinham o general Indj ai em linha de mira por negócios de tráfico de cocaína».

Passou despercebido a muitos correspondentes europeus em Bissau, mas a população da cidade ficou surpreendida quando esta sexta-feira quando viram, nas ruas da capital, pequenos e grandes traficantes, que estavam na sombra e mantinham uma discrição absoluta, manifestarem-se euforica e alegremente nas suas viaturas, comemorando o regresso a um «estado» que lhes convém. Guiné-Bissau regressa ao paraíso do narcotráfico.

Rodrigo Nunes


Foto: Zamora Induta, à esquerda, e António Indjai à direita

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