Eu não entrarei num processo onde não tenho a certeza de que a minha presença será bem interpretada”, afirmou Pedro Pires em declarações a este jornal, acrescentando que, “há muita gente que compreenderia e aceitaria tal mediação, mas há outras que poderiam levantar certas reservas”.
Para o antigo chefe de Estado cabo-verdiano, que concluiu no final da semana passada uma mediação da União Africana (UA) na Tunísia visando o regresso daquele país à normalidade constitucional, o seu envolvimento numa missão do género na Guiné-bissau teria que contar com a anuência prévia de todas as partes envolvidas.
“Conheço a atitude e os sentimentos dos guineenses em relação à minha pessoa e conservo imensos amigos naquele país, mas nunca farei nada que não seja desejado tanto pelos actores políticos como pelas Forças Armadas”, asseverou, garantindo que nessa matéria “não tomaria nunca a iniciativa” que teria de partir de outras entidades interessadas.
Neste leque, Pedro Pires inclui a Comunidade Económica do Estados da África do Oeste (CEDEAO), a Comunidade dos Povos de Língua Portuguesa (CPLP) e a União Africana (UA), organizações internacionais que, segundo o antigo dirigente do partido que governou a Guiné Bissau e Cabo Verde, “têm a obrigação de tudo fazer para ajudar nesse processo”.
Instado a apreciar a actual situação política, militar, económica e social na Guiné-bissau, Pedro Pires considerou ser “urgente” uma mudança de fundo para que o país possa reencontrar a estabilidade e o caminho do desenvolvimento.
“Não vou enganar ninguém, e a minha opinião é que é fundamental uma mudança na atitude dos militares guineenses, que os princípios do Estado de Direito prevaleçam e que as Forças Armadas se limitem às suas atribuições de protecção e defesa da soberania nacional deixando os outros órgãos do Estado fazer o seu papel sem estarem condicionados por aquilo que pensam, desejam ou fazem os militares”, defendeu o comandante de brigada.
Para o antigo presidente cabo-verdiano, a principal condição para aquele país lusófono regressar definitivamente à normalidade constitucional é o entendimento desta realidade por parte dos militares, que “não podem reclamar para si funções políticas porque não são órgãos eleitos”.
Nesta perspectiva, assegura Pedro Pires, “é a vontade popular que deve comandar os destinos da Guiné-bissau e não uma pseudo legitimidade histórica, porque ela não existe”.
Antigo combatente da luta de libertação dos dois países, que teve como palco físico o território guineense, Pedro Pires foi um dos principais dirigentes do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
Comandante de brigada, foi, posteriormente, primeiro-ministro de Cabo Verde durante o período de Partido Único (de 1975 a 1990) e eleito democraticamente Presidente da República do arquipélago, cargo no qual cumpriu os dois mandatos de 5 anos constitucionalmente permitidos (de 2001 a 2011). Desde que deixou as funções de chefe de Estado, Pedro Pires, distinguido em 2010 com o Prémio Mo Ibrahim, que premeia a boa-governação nos países africanos, tem-se dedicado, entre outras acções, a missões de paz e de busca da estabilidade em vários pontos do continente, por solicitação da União Africana e de outras organizações internacionais.
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