Bissau, 29 set (Lusa) - Teresa N'Tomba, 40 anos, vivia com "os olhos vendados" até que a escola para adultos lhe mostrou o mundo, explicou a guineense à Lusa, relatando como a vida mudou depois de aprender a ler.
A maioria das mulheres da Guiné-Bissau entre os 15 e os 24 anos é analfabeta: os únicos dados disponíveis sobre alfabetização no país dizem respeito àquela faixa da população e indicam que apenas 40 por cento consegue perceber as letras.
Para atacar o problema, o Ministério da Educação alfabetizou cerca de 4000 adultos em 2012, com o apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) através de financiamento do governo do Japão.
A implementação do programa arrancou em 2010 com suporte técnico do governo cubano, funciona em 60 pontos do país e estima-se que este ano consiga abraçar outros 5000 adultos.
Teresa, com seis filhos, foi uma das mulheres na aldeia de Lendem que aprendeu a ler e a escrever: ela e as colegas falaram à Lusa em crioulo, tal como fazem no dia-a-dia, mas seja em que língua for, as letras deixaram de ser desconhecidas.
"Muitos homens pensavam que nós só servíamos para estar casa", queixa-se Nita Sanha, 35 anos, mãe de três filhos e outra frequentadora das aulas, sendo hoje um exemplo de que o alfabeto é ferramenta para ajudar à igualdade de géneros.
Agora diz-se disposta a trabalhar "em tudo, num gabinete, como enfermeira ou como jornalista", refere, sem medo de entrar em domínios por tradição reservados aos homens.
Augusta Fula, 28 anos, também ganhou novos horizontes, porque já sabe "ler comunicados", mas com quatro filhos em casa prefere gabar-se de já conseguir distinguir "quando têm nota positiva ou negativa na escola".
Para além de ajudarem as famílias a vencer novos desafios, estas mulheres acreditam que são também uma mais-valia para as comunidades onde vivem, como seja, no acesso a serviços de saúde e prescrição de medicamentos.
"Antes, quando os médicos escreviam uma receita, não sabíamos nada, mas hoje conseguimos ler e ter um lugar na sociedade", referiu Isabel N'Coq Imbali, 39 anos, mãe de cinco filhos.
Todas têm um pedido em comum: querem que o UNICEF continue com o projeto, porque os maridos "também não sabem ler, mas têm vergonha de estar na mesma classe da mulher", conta Augusta Fula.
Ou seja, encontrar nestas turmas um homem como Tóbana Tchenque, 40 anos, pai de seis filhos, é uma exceção, mas ele dá graças por ter acompanhado as mulheres.
"Agora quero continuar", contou o lavrador à agência Lusa, reconhecendo que aquilo que conquistou o ajuda muito: "no mercado eu não conseguia falar com ninguém" e no hospital "quando o médico começava a escrever, ficava com medo", atitudes que mudaram depois de perceber os papéis com que é confrontado.
Nestas ações de alfabetização, aprender a usar o abecedário leva três meses, com aulas de duas horas, de segunda a sexta, explica Braima Indjai, representante do departamento de alfabetização do Ministério da Educação.
Depois, seguem-se outros dois níveis de aperfeiçoamento, igualmente divididos por diferentes trimestres cada.
Mas a principal preocupação reside agora em criar formas de alfabetização funcional, ou seja, em que é dado emprego a quem aprende a ler e a escrever, para que "não esqueçam tudo, passados três ou quatro meses em casa".
Em Lendem, as mães prometem praticar um pouco todos os dias, que mais não seja, com os filhos, que são hoje mais encorajados a trazer boas notas da escola.
Agência Lusa
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