União Europeia abandonou a táctica do pau e da cenoura em relação à Guiné-Bissau e quer usar apenas o pau. Será o mais conveniente?
Na semana passada, a União Europeia (UE) decidiu suspender a ajuda financeira que tem vindo a dar à Guiné-Bissau. Não fosse a intervenção de Portugal e a UE teria igualmente congelado os bens e proibido a deslocação à Europa de diversos altos responsáveis do país. Este endurecimento da posição da UE em relação à Guiné-Bissau não é propriamente uma surpresa. No ano passado a UE já tinha optado por não renovar a missão para a reforma do sector da segurança na Guiné-Bissau. No seu conjunto, estas decisões revelam que, nas actuais circunstâncias, aparentemente a UE não pretende continuar com a sua estratégia de engajamento em relação à Guiné-Bissau. Será a decisão mais acertada?
Mesmo que concordasse com a posição da UE, Luís Amado teria sempre de tentar defender os interesses da Guiné-Bissau em Bruxelas. Afinal, na sua relação diplomática com os países de língua portuguesa, Portugal reivindica para si o estatuto de principal defensor dos seus interesses em Bruxelas. De qualquer modo, tendo conta a posição que assumiu na semana passada, Luís Amado parece ter uma noção muito clara do que está em jogo.
Nesta altura a UE parece inclinar- -se para a adopção de uma estratégia de contenção, que privilegie instrumentos de natureza repressiva e que favoreça o confronto político. Mais do que com a cenoura, nesta fase a UE quer acenar com o bastão à Guiné-Bissau. Todavia, esta estratégia, se vier a ser adoptada, muito provavelmente estará condenada ao fracasso, uma vez que a UE não tem a influência e os recursos de poder necessários para impor a sua vontade aos actores políticos e sobretudo às chefias militares da Guiné-Bissau. Dito de outro modo, a UE tem capacidade para causar danos, mas não tem poder para alterar o curso dos acontecimentos. Logo, tanto quanto é possível prever, a implementação de uma estratégia de contenção não parece ser uma abordagem vencedora.
Acresce que, sem a ajuda financeira da UE, a Guiné-Bissau procurará reforçar outras alianças. As visitas nos últimos nove meses de diversas figuras políticas e militares da Guiné-Bissau a Angola, ao Irão ou à Líbia ilustram bem algumas das opções disponíveis.
Inevitavelmente, sobre isso não haja ilusões, o espaço vazio deixado pela UE será ocupado por outros actores. Na sequência da decisão tomada pela UE na semana passada, a promessa imediata da África do Sul e do Brasil de apoio à Guiné-Bissau é um sinal claro disso mesmo. Na prática, se adoptar uma estratégia de contenção, a UE abdica, sem qualquer contrapartida, da pretensão de exercer alguma influência positiva na Guiné-Bissau. No pior dos cenários, uma estratégia de contenção poderá mesmo contribuir, de forma passiva e activa, para reforçar a espiral rumo ao estatuto de estado falhado, ou a consolidação da Guiné-Bissau enquanto narcoestado na África ocidental.
Em suma, a UE tem à sua frente um falso dilema. Na verdade, Bruxelas não tem uma alternativa credível e eficaz, pelo que a manutenção da estratégia de engajamento, seguida nos últimos anos, é uma inevitabilidade. Na melhor das hipóteses, a UE pode reformular a estratégia de engajamento de modo a assumir uma natureza mais mitigada, num processo a que Portugal prestará seguramente especial atenção.
Director do Instituto Português de Relações Internacionais e Segurança (IPRIS)
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