Bissau - O Secretariado Nacional de Luta contra a SIDA (SNLCS) da Guiné-Bissau lamentou ontem (terça-feira) que mais de 20 anos após o primeiro caso conhecido no país "o estigma continua a ser um dos maiores obstáculos" no combate à pandemia.
João Silva Monteiro, secretário executivo do SNLCS, disse que até hoje nunca alguma figura pública se assumiu como seropositiva, porque apesar de todas as campanhas se "teme a exclusão".
"Outro sinal triste da estigmatização prende-se com o facto de muitos guineenses escolherem a calada da noite para procurar anti - retrovirais", disse o responsável, que criticou "os próprios serviços do Estado que praticam a estigmatização" quando exigem o teste de SIDA a candidatos a bolsas de estudo no exterior.
João Silva Monteiro disse à Lusa que há países como a China ou a Rússia que exigem esse teste, mas que os serviços competentes o fazem mesmo para candidatos a bolsas para países como Brasil ou Portugal, que não têm essa exigência.
"É contra a lei e é desumano", disse, acrescentando que é também "monstruoso" que se tenha chegado ao ponto de impedir uma pessoa de ser jornalista por ser seropositiva.
O SNLS iniciou hoje (terça-feira) em Bissau um encontro para debater a lei 5/2007, de prevenção e tratamento da SIDA, na tentativa de, através de melhoramentos da lei, se possa chegar "à realização plena e universal dos direitos do Homem e das liberdades
fundamentais".
É que, disse o secretário executivo, "se há discriminação é porque a lei ou não foi suficientemente divulgada ou porque tem lacunas ou está desactualizada".
Segundo um relatório hoje (terça-feira) divulgado pelas Nações Unidas, pelo menos 2,5 milhões de pessoas contraíram o vírus da SIDA em 2011, com a África subsahariana a ser a mais afectada. A Guiné-Bissau está no grupo de países onde houve um aumento
de pelo menos 25 porcento de novas infecções.
Em Setembro passado, as organizações de luta contra a SIDA na Guiné-Bissau já tinham alertado para a situação "muito delicada" em que estava o país, quase sem apoios depois de o Fundo Global (organização internacional de apoio à luta contra a malária, tuberculose e SIDA) ter cancelado a cooperação.
Os cortes, disseram, começaram há um ano mas agudizaram-se depois do golpe de Estado de 12 de Abril passado. O país ficou durante algum tempo praticamente sem reservas de medicamentos e de suplementos alimentares.
João Silva Monteiro disse hoje (terça-feira) que os problemas começaram antes, por alegadas irregularidades na gestão do dinheiro do Fundo Global, mas considerou que o país viveu "uma sanção" (pelo golpe).
"O Fundo Mundial anunciou que vinha. Antes diziam que não vinham por motivos de segurança", disse o responsável, precisando que a delegação do fundo chegará a Bissau no início do próximo mês para negociar um novo programa, mas mais reduzido e sem apoios para organizações da sociedade civil, que faziam a prevenção.
"Penso que não é sério dizer que estamos a financiar a luta quando a prevenção é completamente tirada do programa. Como é que podemos travar a SIDA se não evitamos novas infecções? É insensato", disse.
Questionado sobre os mais recentes números de infecções na Guiné-Bissau, João Silva Monteiro disse que essa estatística está a ser preparada.
"Até ao ano passado, tínhamos baixado novas infecções em 25 porcento. Agora passámos um ano sem preservativos, é complicado", disse.
Segundo números da Rede Nacional de Pessoas com HIV-SIDA, a Guiné-Bissau, com uma prevalência de 3.4, é dos países da região com maior taxa, havendo neste momento mais de 50 mil pessoas infectadas.
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