António Indjai com o presidente da Comissão Nacional de Eleições, Desejado Lima da CostaFotografia © Stringer-Reuters
Declarações do responsável das forças armadas guineenses estão a provocar agitação interna e preocupações no exterior.
A tensão política em Bissau conheceu novo agravamento nas últimas horas, após o ministro de Defesa angolano, Cândido Pereira Van-Dúnem, ter entregado uma carta de José Eduardo dos Santos ao Presidente interino guineense sobre "a cooperação bilateral" entre os dois Estados.
O conteúdo da carta para Raimundo Pereira expressa as preocupações de Luanda sobre as recentes declarações do chefe de estado-maior general das forças armadas, António Indjai, a 30 de março, em que este criticou a atuação da Missão Militar Angolana na Guiné-Bissau (Missang) por "atuar fora do seu mandato".
Fontes guineenses revelaram ao DN que as declarações de Indjai resultam de "fortes pressões" de alguns setores militares e civis para "pôr termo ao impasse" em torno da segunda volta das presidenciais. O objetivo seria tornar "desconfortável" o ambiente em Bissau para os cerca de 120 militares angolanos, levando Luanda a ordenar a sua retirada por receio de se verificarem confrontos.
O caminho ficaria assim livre para uma possível atuação dos elementos ligados àquele chefe militar, segundo a leitura concordante feita em Bissau e por fontes no exterior familiarizadas com a situação. O objetivo seria afastar o PAIGC do poder e abrir mais um interregno institucional na vida política do país.
Aquelas fontes consideram que qualquer pronunciamento na atual situação poria em causa os esforços de reconstrução do Estado e de estabilização do país, tornando-o de novo presa fácil para os grupos do narcotráfico.
Por seu lado, Luanda teme o tratamento de "isolamento" a que estariam a ser submetidos os seus militares e a eventualidade de baixas, o que não deixaria de ser uma má notícia em ano de eleições internas.
Angola estaria disponível para manter as suas tropas na Guiné-Bissau, mas considera importante a reformulação do mandato da Missang, colocando-a sob o âmbito das Nações Unidas, CPLP ou de organizações regionais como, por exemplo, a CEDEAO. Fonte diplomática indicou ao DN existir disponibilidade de outros países para um envolvimento mais direto. A questão será também abordada a breve trecho no quadro da CPLP.
A Missang foi estabelecida em março de 2011 para apoiar a reforma no setor da defesa e segurança guineenses, após os acontecimentos que culminaram no golpe militar de abril de 2010, em que o primeiro-ministro Gomes Júnior foi colocado sob prisão domiciliária e afastado o então responsável pelas forças armadas, Zamora Induta.
A escalada acentuou-se após a reunião de terça-feira entre Raimundo Pereira e Cândido Van-Dúnem, em que esteve presente o próprio Indjai. O Governo divulgou hoje de manhã um comunicado em que reafirma a vontade de que a Missang permaneça no país e, facto significativo, revelou ter-se reunido "extraordinariamente" para analisar o "posicionamento publicamente assumido" por Indjai. No mesmo comunicado, o Governo guineense recorda ter sido este comandante militar a negociar a constituição e âmbito da Missang, numa visita a Luanda em setembro de 2010.
Sinal de que a tensão pode aumentar nas próximas horas ou dias, está o facto do ministro Cândido Van-Dúnem ter deixado Bissau com o embaixador do seu país e de estar em preparação, segundo fontes próximas do PAIGC, cuja direção teve uma demorada reunião na terça-feira, uma "forte mobilização popular" junto da embaixada de Angola na capital guineense.
O pretexto da presente tensão reside nos resultados da primeira volta das eleições presidenciais em que Gomes Júnior, candidato pelo PAIGC, e Kumba Ialá, pelo PRS, surgiram como mais votados. Desde então, Ialá tem contestado aqueles resultados e mostra-se intransigente no boicote à segunda volta, cujo início da campanha está marcado para 5 de abril.
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