O golpe de Estado de quinta-feira passada na Guiné-Bissau "começou a ser trabalhado" três dias antes, no dia 09, quando os militares souberam que o primeiro-ministro ia pedir uma intervenção da ONU, disse hoje o porta-voz dos militares.
Em entrevista à Agência Lusa, Daba Na Walna, até aqui o rosto do Comando Militar que desencadeou o golpe, explicou que a ação militar foi "uma espécie de antecipação" do que aconteceria, um "golpe de legítima defesa", para impedir que forças estrangeiras "viessem esmagar as Forças Armadas da Guiné-Bissau".
Tudo girou à volta da presença de uma missão angolana em Bissau, a chamada Missang, explicou o tenente-coronel ao explicar o golpe, que disse ter sido objeto de muita discussão, acabando por prevalecer a decisão de se avançar.
O golpe, com a prisão do Presidente interino e do primeiro-ministro, deu-se poucas horas depois de uma conferência de imprensa em que Kumba Ialá, líder do maior partido da oposição e candidato presidencial, disse que não iria haver campanha de ninguém para a segunda volta das eleições presidenciais, marcadas para dia 29.
A associação entre as ameaças de Kumba Ialá e o golpe que se seguiu foi feita mas Daba Na Walna garante que foi apenas uma coincidência. "Se Kumba Ialá estivesse a par do que estava a acontecer seria muito imprudente dizer isso publicamente. Foi mera coincidência. Kumba Ialá não tinha conhecimento de nada e é bom que isso fique bem claro. Tentou fazer-se essa colação entre políticos e Forças Armadas, não tivemos nada a ver com isso", diz.
A relação entre as Forças Armadas e a Missang vinha a deteriorar-se nos últimos tempos mas azedou ainda mais quando o embaixador de Angola em Bissau disse a António Indjai, chefe do Estado Maior General das Forças Armadas, que tinha informações de que estava a ser preparado um golpe militar, conta Daba Na Walna. E o golpe final terá sido, continua, após o conhecimento de uma carta que o primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, teria escrito ao secretário-geral da ONU a pedir uma força das Nações Unidas.
A carta foi divulgada na quarta-feira e apesar de assinada não foi escrita em papel timbrado nem tem qualquer carimbo. "Se quiséssemos mentir e forçar provas teríamos obrigado o primeiro-ministro a pôr o timbrado da primatura (gabinete do primeiro-ministro). Tivemos a carta através de Carlos Pinto Pereira (antigo assessor jurídico de Henrique Rosa quando este foi Presidente interino e assessor jurídico de Carlos Gomes Júnior). Vimos que não era timbrada mas entregámos porque estamos certos, se estivermos a mentir Deus sabe", diz o militar.
E o pior, diz também, é que a carta foi entregue ao ministro dos Negócios Estrangeiros de Angola, Georges Chicoti. "Ainda que admitamos que a carta pudesse ter algum sentido, o portador não devia ser o ministro das Relações Exteriores de Angola, não somos um protetorado de Angola".
Por isso, conclui: "Para nós era uma cabala a ser montada contra nós e o objetivo da vinda estrangeira era simplesmente esmagar as Forças Armadas da Guiné".
Lusa
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