Quem passou junto ao Hospital Termal e ao Céu de Vidro nos passados dias 28 e 29 de Agosto com certeza não ficou indiferente à música que se ouviu a partir do final da manhã e ao reboliço que por ali se via. O motivo: os almoços promovidos pela Associação Cultural e Recreativa dos Naturais e Amigos de Oio-Guiné-Bissau, pintados pelas cores dos trajes guineenses e cujo ritmo era marcado pela música daquele país africano.
Em dois almoços em que os pratos de galinha vindos da Guiné estiveram em destaque, a galinha de cafriela, o caldo de amendoim e o caldo de dendém fizeram as delícias das mais de 250 pessoas que por ali passaram nos dois dias. Fosse pela saudade dos sabores guineenses, fosse pela mão das cozinheiras, “escolhidas a dedo”, certo é que os pratos fizeram as delícias de quem aceitou o convite da associação, neste terceiro convívio que a associação promoveu nas Caldas da Rainha.
Depois de bem comidos e bem regados, os participantes neste almoço guineense no Céu de Vidro seguiram rumo ao CCC, onde decorreu um desfile de trajes típicos da Guiné. Em ambiente descontraído, passaram pela passerelle trajes de cerimónia e trajes coloridos, tão facilmente associados à antiga colónia ultramarina portuguesa. E à boa maneira africana, não houve quem resistisse durante muito tempo à música que acompanhou o desfile, que acompanhou em verdadeiro ambiente de festa, que depois se prolongou, novamente no Céu de Vidro. No mesmo fim-de-semana, chegava ao fim a exposição de artigos guineenses que a associação mostrava na Capela de São Sebastião desde o dia 7 de Agosto.
Augusto Mansoa, o presidente da Associação Cultural e Recreativa dos Naturais e Amigos de Oio-Guiné-Bissau salientou que a importância de iniciativas como esta reside no facto de permitirem que a associação partilhe “o seu sentimento de humanismo e mostre que, apesar das diferenças nas foras de pensar, o ser humano vive e partilha e, quando quer, consegue grandes feitos para todos nós”. A residir e a trabalhar nas Caldas há cerca de 24 anos, onde é cirurgião no Centro Hospitalar, Augusto Mansoa diz que os guineenses foram “acolhidos nesta cidade, acarinhados e ajudados, aceitos como gente de bem”. E garante: “queremos assim continuar”.
Os convívios anuais da associação servem precisamente esta integração na cidade e no país que escolheram para viver, na impossibilidade de permanecerem no lugar onde nasceram. Além de muitos guineenses espalhados por vários pontos de Portugal, os encontros atraem ainda muitos portugueses que a determinada altura das suas vidas viveram na Guiné, e que se deixaram morder pelo ‘bichinho de África’.
“Conversamos de tudo um pouco, lembramos coisas boas e algumas menos boas, comemos, bebemos, dançamos, no fundo convivemos como seres humanos que somos”, disse o cirurgião guineense, que defendeu que “o isolamento e a solidão são o pior inimigo do Homem e da Humanidade”. Todos somos cidadãos do mundo e “não temos o direito de estragar o que há de melhor nesta vida: a amizade, a liberdade e a solidariedade, valores muitas vezes esquecidos”.
A Associação Cultural e Recreativa dos Naturais e Amigos de Oio-Guiné-Bissau empenha-se em trazer a Portugal os sabores e acultura guineenses. “São pequenos fragmentos de todo o universo que temos espalhado por diferentes espaços do continente”, explica o presidente da associação. Nascida há quase oito anos nas Caldas, a associação tem sede provisória em Lisboa e junta actualmente cerca de 300 membros.
Guiné precisa de uma segunda independência
Em Portugal há mais de duas décadas, Augusto Mansoa tem voltado à Guiné-Bissau a cada dois anos. Mas o país que encontra hoje “é muito diferente” daquele que deixou.
“Quando chego a Bissau e vejo as ruas cheias de buracos, eu choro. Quando vejo a cidade que em tempos foi considerada uma das cidades mais limpas da África Ocidental cheia de amontoados de lixo no meio da estrada, entristece-me de sobremaneira. Vejo as crianças em idade escolar com cestos na cabeça, com víveres para vender para poderem sobreviver, e também é uma tristeza muito grande para mim”, lamenta.
Mas o que é preciso para que as coisas mudem? Augusto Mansoa não hesita na resposta. Falta união nacional. “Nós estamos neste momento a tentar construir um todo nacional a partir de pequenas coisas e penso que com isso podemos fazer alguma coisa de concreto”.
A união que falta é a mesma que o país vivia quando conseguiu a independência. “Neste momento eu acho que falta uma segunda unidade, mas uma unidade séria para a Guiné conquistar uma segunda independência que considero extremamente importante, a independência económica”, diz.
Ciente de que, neste momento, a Guiné é “um país muito débil”, Augusto Mansoa acredita que a união terá que se fazer em várias vertentes. A associação que preside está a trabalhar em questões sociais e culturais. “Através da cultura vamos buscar alguns pontos de união e é isso que nos interessa de sobremaneira”. Já as questões políticas deixa-as para os políticos. “Esses terão que ser capazes de se entender na sua esfera”, afirma.
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