O porta-voz do Comando Militar que tomou quinta-feira o poder na Guiné-Bissau insistiu hoje que foi Angola quem levou as Forças Armadas guineenses a desencadear o golpe de Estado, para evitar a morte da cúpula da hierarquia castrense
Numa entrevista telefónica à Rádio de Cabo Verde, Daba Na Wana contou a versão do Comando Militar sobre o que levou aos acontecimentos da passada quinta-feira, argumentando que foi Angola quem "violou" o acordado entre os dois países, ao enviar para a Guiné-Bissau "material de guerra" à revelia das forças de segurança locais.
Daba Na Wana defendeu que a cooperação técnico-militar bilateral previa que Angola prestasse apoio na reforma da Defesa e Segurança da Guiné-Bissau e que o armamento pesado trazido para a sede da Missang (missão angolana em Bissau), além de não estar previsto, tinha outros fins.
O porta-voz dos revoltosos referiu que os "tanques com lagartas, carros de combate e alguns morteiros para canhão" chegaram inicialmente a Bissau sem conhecimento das Forças Armadas, que pediram explicações à Missang, tendo-lhes sido respondido que se destinavam a reforçar o exército guineense. "Tudo começou com um clima de desconfiança, que foi continuado desde que a Missang começou a transportar para Bissau material de guerra, violando claramente os acordos assinados entre os dois países no domínio da Defesa e Segurança. O acordo não incluía o envio de armas", afirmou.
Daba Na Wana acrescentou que as dúvidas acentuaram-se quando, antes da primeira volta das eleições presidenciais (18 de abril), "Angola substituiu o pessoal técnico sénior - pedreiros, carpinteiros e engenheiros da construção civil, para a reabilitação de casernas - por uma equipa de militares composta por tropas especiais".
Após a polémica, acrescentou, Angola acedeu em treinar militares guineenses com os novos equipamentos, "comprados na África do Sul", uma vez que o exército local "estava habituado a lidar com material soviético", o que aconteceu durante um mês, após o que os "meios blindados" seriam entregues as forças locais.
O porta-voz do Comando Militar indicou que, depois, as chefias militares da Missang alegaram que não tinham competência para entregar o material, remetendo a questão "para os políticos" e foi nessa sequência que se deu a discussão entre o embaixador de Angola em Bissau e o ministro da Defesa guineense. "(O ministro da Defesa guineense) chamou o embaixador para lhe dar conta das preocupações das Forças Armadas e dele próprio. O embaixador ameaçou-o, chamando-lhe a atenção para as palavras que estava a dizer, porque aquilo poderia ser considerado uma ofensa para Angola", afirmou Daba Na Wana, na entrevista à Rádio de Cabo Verde.
"Depois desse clima de desconfiança, o primeiro-ministro (guineense) escreveu uma carta secretamente, sem passar pelo Conselho de Ministros ou pelo Parlamento, a pedir às Nações Unidas para intervir ou a aprovar uma resolução que permitisse o uso de força ou o envio de militares para um país que não está em guerra. O portador da carta foi o Ministro das Relações Exteriores de Angola, George Chicoti", disse. "Não tendo sido o MNE guineense o portador da carta, das duas uma: ou a carta foi escrita a pedido de Angola ou foi o Governo angolano que fez a carta e pediu ao Governo de Bissau apenas para assinar" um documento a pedir à ONU a aprovação de uma resolução que legitimasse o envio da força, "a integrar por Angola, Brasil, Gana e outros países da sub-região".
"Perante o cenário, não podíamos ficar de braços cruzados à espera de uma força expedicionária do exterior para um país que não está em guerra", concluiu o porta-voz do Comando Militar guineense.
Lusa
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