quarta-feira, 6 de abril de 2011

Os responsáveis pela instabilidade terão de se subordinar ao poder político

Opinião

Rodrigo Nunes

Luanda - Um ano depois do Golpe de Indjai, a Guiné-Bissau enfrenta ainda as ameaças de sanções por parte da União Europeia. Apesar dos responsáveis guineenses anunciarem o sucesso da sua estratégia diplomática, a verdade é que mensagem de Bruxelas é clara: os responsáveis pela instabilidade terão de se subordinar, de uma vez por todas, ao poder político democraticamente eleito pelo povo Guineense.

Nos dias 29 e 30 de Março, o Primeiro Ministro Carlos Gomes Júnior discutiu com os parceiros europeus o actual estado da Guiné Bissau, avaliando o percurso político e judicial efectuado pelo país no último ano. Apesar dos notórios progressos ao nível da estabilidade do país, a União Europeia não alterou a sua posição de suspender o seu apoio ao país, caso não sejam dados passos claros no sentido de cumprimento dos princípios democráticos e o respeito pela constituição do país.


Em causa está o Golpe de 1 de Abril de 2010, liderado por António Indjai e que culminou na detenção do então Chefe de Estado Maior Zamora Induta e do próprio Primeiro Ministro Carlos Gomes Júnior, libertado algumas horas depois fruto da intensa pressão internacional efectuada sobre os revoltosos. Um ano depois, a posição de Bruxelas demonstra que a União Europeia não esqueceu estes acontecimentos e as suas consequências directas. António Indjai, o líder dos revoltosos, acabou por ser coroado Chefe de Estado-maior General, e Bubo Na Tchuto, rotulado como narcotraficante pelo Departamento do Tesouro dos EUA, acabou à frente da Armada Guineense.


Mas não é só o Golpe de 01 de Abril que impede a reabertura das portas europeias à Guiné-Bissau. Também o “congelamento” dos processos relativos às mortes do ex-Presidente “Nino” Vieira, do ex-CEMGFA Tagme na Waie e dos políticos Hélder Proença e Baciro Dabó é um obstáculo à aceitação da Guiné-Bissau pela Comunidade Internacional como um Estado Democrático. Dois anos volvidos sobre os assassinatos, a Procuradoria-Geral da República reconheceu agora em Bruxelas o que há muito se comenta em Bissau: a sua completa incapacidade para concluir os processos sem apoio externo. Amine Saad, o Procurador-Geral da República em funções, justifica o “congelamento” dos processos na impossibilidade de ouvir a esposa de “Nino” Vieira, Isabel Vieira, presente na residência na noite dos acontecimentos e testemunha ocular dos acontecimentos de 2 de Março. Desde essa noite, Isabel Vieira refugiou-se na Europa, recusando-se a viajar para Bissau por questões de segurança, situação nunca resolvida pela Procuradoria.


Nunca resolvido também pelo gabinete de Amine Saad foi a situação do militar Pansau Intchama, apontado como um dos principais envolvidos nos acontecimentos de 2 de Março. Intchama foi enviado pelo Ministério da Defesa guineense para participar num curso de formação em Portugal, ao abrigo da cooperação militar entre os dois países. No entanto, e apesar do carácter oficial da sua deslocação, o PGR Amine Saad nunca solicitou a extradição do militar guineense para prestar a sua versão dos acontecimentos da noite em que “Nino” Vieira foi assassinado.


Como consequência deste “congelamento”, Zamora Induta, afastado do cargo de CEMGFA pelo seu subalterno António Indjai, permaneceu oito meses detidos na prisão militar de Mansoa, tendo sido libertado em Dezembro de 2010. Já em 2011, a Procuradoria de Amine Saad tentou responder à pressão internacional que reclamava a libertação do ex-CEMGFA, lançando um comunicado que referia que a Induta não estava indiciado em nenhum dos crimes de 2009. No entanto, em Bruxelas, a delegação rejeita a possibilidade de saída da Guiné de Zamora Induta para tratamentos médicos no exterior com o argumento de que o ex-CEMGFA tinha sido constituído suspeito no quadro do processo às mortes de Helder Proença e Baciro Dabó, em Junho de 2009.


Perante os avanços e recuos que marcaram o último ano judicial guineense, o Primeiro Ministro tentou rodear-se de aliados de ocasião, como foi o caso do CEMGFA António Indjai, num claro reconhecimento de que o não confronto seria a melhor estratégia para lidar com os golpistas de 1 de Abril. Carlos Gomes Júnior levou esta estratégia para o campo político, chamando a si elementos da oposição, como foi o caso da nomeação, nunca confirmada mas também nunca desmentida, de Ernesto Carvalho para o cargo de Conselheiro de Segurança.


Ernesto Carvalho, ex-Ministro do Interior do Governo PRS, é uma peça chave na estratégia de Carlos Gomes Júnior devido às suas fortes ligações com os quadros do seu antigo ministério, e com a ala radical balanta de Koumba Yala, determinante no controlo e direccionamento das intenções dos militares guineenses.


Rodeando-se de ex-inimigos, Carlos Gomes Júnior conseguiu o que a comunidade internacional considerava impossível há um ano atrás: manter-se à frente do executivo e evitar a tomada de poder pelos militares. No entanto, apesar dos sorrisos da delegação guineense no final da sessão de consultas com a União Europeia, a Guiné Bissau continua ameaçada pela imposição de sanções às principais figuras do Estado e outras de carácter económico pelos seus parceiros europeus. Uma ameaça que só se desvanecerá quando as principais figuras do país decidirem apresentar medidas concretas para a resolução dos problemas crónicos que afectaram os últimos anos na Guiné-Bissau.

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