terça-feira, 31 de maio de 2011

EQUIPAMENTO DA ANTIGA UNIDADE DE COIMBRA

Material pediátrico vai
salvar vidas na Guiné-Bissau
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Toneladas de material foram acomodadas ontem num contentor e serão a “Ajuda Amiga” para milhares de crianças que morrem por ano, nos hospitais guineenses, por falta de cuidados de saúde mínimos

O trabalho é árduo. Afinal, são mais de centena e meia de camas, muitos mais colchões, bancos, cadeiras, marquesas, armários, vitrinas, secretárias, balanças, cabides, cadeiras de rodas, alguns brinquedos e também aparelhos médicos. Tudo isto para tirar de dentro do velho edifício, acomodar junto às antigas Urgências e, depois, transferir para dentro de um grande contentor. E tudo num só dia.
O trabalho é árduo, e os braços são poucos. Mesmo com a ajuda de alguns elementos dos Bombeiros Sapadores de Coimbra, não é fácil a tarefa dos membros da Associação “Ajuda Amiga” que ontem deram um passo fundamental para um grande projecto, ao encherem o grande contentor com o material deixado no antigo Hospital Pediátrico de Coimbra e que, no próximo mês, irá apetrechar por completo a Pediatria de um Hospital Central em Bissau, na Guiné.
Estes objectos, a maioria de grande volume e difíceis de transportar e acomodar, já serviram milhares e milhares de crianças portuguesas, da região e até do país. Agora, serão a esperança para outras milhares e milhares de crianças na Guiné-Bissau que, neste momento, não têm camas, nem marquesas, e muito menos brinquedos para os receber nos hospitais, quando estão doentes, muitas acabando por morrer por falta de assistência.
Sétima maior taxa
de mortalidade infantil
«É indescritível a forma como é feito o trabalho pediátrico na Guiné. Não há o mínimo de condições. As crianças são deitadas no chão, ou em panos que os pais trazem de casa», conta ao Diário de Coimbra Natália Cristina, presidente da Associação “Viver sem fronteiras”, parceira da “Ajuda Amiga” neste projecto, e responsável pela chegada, ontem, ao antigo Pediátrico, do grande contentor que transportará todo o material de Coimbra até à Guiné.
Em Coimbra, a dois dias de partir para aquele país, onde, entre outras tarefas, irá negociar com o primeiro-ministro e o ministro guineenses a forma de utilização do conteúdo do contentor, esta que é uma das portuguesas com maior experiência na ajuda humanitária na Guiné-Bissau - sendo, aliás, membro da Embaixada Militar e Soberana da Ordem de Malta, naquele país – sabe bem o que a espera e sabe também a importância deste donativo para «milhares de crianças guineenses e suas famílias».
Segundo dados oficiais, em 2010 morreram 96,23 crianças em mil na Guiné-Bissau, sendo este o sétimo país com maior taxa de mortalidade infantil do Mundo. Muitas destas mortes ficaram a dever-se à precariedade nos cuidados de saúde pediátricos.
«Como mãe é chocante ver uma criança a morrer simplesmente porque o hospital não tem nada para lhe proporcionar», desabafa, entre suspiros, explicando que, muitas vezes, os médicos passam receitas às famílias para que comprem tudo o que é necessário para os mínimos cuidados primários: «e quando digo tudo, é mesmo tudo, desde a agulha, ao desinfectante, passando pela ligadura, compressa ou medicamento», garante.
Isto já para não falar na falta de pessoal médico. «É muito reduzido e com pediatras e pessoal de enfermagem com formação reduzida», explica Natália Cristina, garantindo que, no caso do Hospital Simão Mendes, para onde será canalizado o material vindo de Coimbra, há apenas um grupo de médicos holandeses, especialistas em cirurgia estética que, durante alguns períodos, se deslocam àquela unidade para os casos de queimaduras ou fendas lábio-palatinas. «De resto, o número é muito reduzido noutras áreas», confirma.
Gestão a cargo da
“Viver sem Fronteiras”
Infelizmente, a tradição existente naquele país de «desvio do material doado» faz com que o trabalho destas duas associações portuguesas e a boa-vontade do Centro Hospitalar de Coimbra não sejam uma garantia de melhores condições físicas para as crianças do Hospital Simão Mendes. Por isso, Natália Cristina irá exigir aos responsáveis políticos que seja a “Viver sem Fronteiras” a fazer a gestão da ala pediátrica daquele centro hospitalar. «Só assim, esta doação terá o devido valor», garante.
Natália Cristina parte amanhã, acompanhada de Carlos Lobo, contando ficar na Guiné-Bissau até 20 de Junho. O contentor partirá no dia 8 de Portugal, devendo chegar ao destino no final do mês, sendo apenas aberto «quando tivermos a garantia de um protocolo de cooperação» entre a associação que preside e o Governo guineense. A responsável está «esperançada» que assim será e que a pediatria, mal acomodada na maternidade do Hospital Simão Mendes, funcionará no edifício renovado que lhe está destinada, neste momento completamente vazio.
Foi praticamente assim, vazio, que ficou, no final do dia de ontem, o antigo Hospital Pediátrico de Coimbra. Neste caso, porque as crianças da região e do país têm agora um novo hospital, com todas as condições e muito material “novinho em folha” para as receber, de cada vez que estiverem doentes.
O equipamento do antigo hospital foi distribuído pelas várias unidades do Centro Hospitalar de Coimbra, tendo também sido doado a associações e organizações, como a “Ajuda Amiga”, cujos projectos foram avaliados e seleccionados. Ainda recentemente, por exemplo, as incubadoras do antigo Pediátrico foram doadas a hospitais de S. Tomé e Príncipe.

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