Praia - O corpo do primeiro Presidente da República de Cabo Verde, Aristides Pereira, foi enterrado esta quarta-feira, na localidade de Fundo das Figueiras, sua terra natal na ilha da Boa Vista, numa cerimónia privada, conforme vontade expressa do antigo chefe de Estado.
As cerimónias fúnebres oficiais, organizadas pelo Estado cabo-verdiano, decorreram terça-feira, na cidade da Praia, perante centenas de personalidades, em que se destacavam o actual presidente de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca; o presidente da Guiné-Bissau, Malam Bacai Sanhá; e os antigos presidentes cabo-verdiano, Pedro Pires, e bissau-guineense, Henrique Rosa.
O acto solene, decorrido numa das salas da Assembleia Nacional (Parlamento) que foi pequena para tantas personalidades, contou ainda com a presença de membros dos Governos de Cabo Verde e da Guiné-Bissau, deputados e antigos combatentes dos dois países que com o finado lutaram juntos pela independência nas décadas de 60 e 70 do século XX.
O elogio fúnebre coube a Pedro Pires, que foi primeiro-ministro durante os primeiros 15 anos de independência de Cabo Verde, altura em que também Aristides Pereira esteve na chefia do Estado cabo-verdiano.
Pedro Pires, que deixou o cargo de presidente da República a 09 de Setembro corrente, lembrou o percurso militar e político de Aristides Pereira, sublinhado três momentos chave da vida do primeiro chefe de Estado cabo-verdiano.
O primeiro, destacou, foi quando, em 1962, o PAIGC decidiu caminhar para a luta armada contra o regime colonial português e necessitava de armamento, que as autoridades de Conakry, onde o movimento tinha a sua sede, recusavam desalfandegar, tendo inclusive mandado deter toda a direção do PAIGC, incluindo Aristides Pereira.
A situação só viria a ser desbloqueada com o regresso de Amílcar Cabral, que se encontrava ausente na altura, após uma intervenção junto do então Presidente guineense, Sekou Touré.
O segundo momento apontado por Pedro Pires foi o papel desempenhado por Aristides Pereira, então secretário-geral adjunto do PAIGC, durante a chamada “Operação Mar Verde”, realizada em Novembro de 1970 e liderada pelo então comandante português Alpoim Calvão.
Esta operação o propósito de derrubar Sekou Touré, matar Amílcar Cabral e resgatar os militares portugueses detidos em Conakry.
Graças à pronta reação das unidades do PAIGC que se encontrava na altura na capital
guineense, esta operação do Exército colonial redundou “num enorme fracasso militar e político” para Portugal.
O terceiro momento aconteceu em Janeiro de 1973, na sequência do assassinato de Amílcar Cabral, então líder do movimento nacionalista da Guiné-Bissau e de Cabo Verde.
Aristides Pereira foi então preso e torturado à bordo de uma embarcação controlada pelos
assassinos do líder do PAIGC, tendo sido libertado graças à intervenção de um navio da Marinha soviética.
Depois de um período de tratamento em Moscovo, Aristides Pereira assumiu a chefia do PAIGC que conduziu a luta para as independências dos dois países.
Para o ex-Presidente cabo-verdiano, Aristides Pereira foi um “homem que esteve presente em todos os “momentos críticos” da vida do PAIGC” e um líder que cumpriu o seu papel e o seu compromisso para com o país.
“Aristides Pereira cumpriu com os seus compromissos de honra e fez história. Que o pó que cobre o seu corpo não deixe esquecer a memória”, foi o apelo vibrante feito por Pedro Pires ao concluir a leitura do seu texto de elogio fúnebre.
Por sua vez, o novo chefe de Estado cabo-verdiano, Jorge Carlos Fonseca, lembrou o homem que, após a independência, “a partir do nada, e quando ninguém acreditava, edificou a administração cabo-verdiana e tornou o país viável”, fundando as bases para que o arquipélago pudesse evoluir política, económica e socialmente.
O novo Presidente cabo-verdiano elogiou também a forma como Aristides Pereira, após a derrota nas primeiras presidenciais, em 1991, se prontificou para avançar com a transição do regime de partido único vigente até 1990, dando rapidamente posse a um Governo da oposição, liderado por Carlos Veiga, presidente do Movimento para a Democracia (MpD).
“Aristides Pereira deixa um legado de luta e de profundo compromisso com Cabo Verde”, declarou Jorge Carlos Fonseca.
Aristides Maria Pereira, de 87 anos de idade, faleceu quinta-feira passada em Portugal, onde se encontrava desde o início de agosto para ser operado em Coimbra na sequência de uma fratura no colo do fémur, agravada pela diabete.
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