A campanha eleitoral na Guiné-Bissau traz para a rua muitas pessoas que se transformam em vendedores de comes e bebes na esperança de fazer negócio com as multidões que correm atrás de carros de som, ações de campanha e comícios.
Praças e ruas habitualmente vazias são agora ocupadas por esplanadas improvisadas ao lado de fogareiros, arcas de bebidas e alguidares de comida distribuídos pelo asfalto esburacado, em especial junto a sedes de campanha e locais que costumam ser palcos de comício.
Isabel da Silva, 44 anos, perdeu o emprego num hotel da cidade e agora vende saquinhos de mancarra (amendoim) e pastéis de peixe feitos em casa, com a ajuda do filho, tudo aconchegado num alguidar de plástico que abraça, sentada num lancil da Praça dos Heróis Nacionais, em Bissau.
"É a primeira vez que estou aqui a vender", refere, enquanto fala das dificuldades provocadas pela crise que o país atravessa e que não dá descanso para quem apenas quer sobreviver.
Precisa de dinheiro e diz que não pode "perder a oportunidade": até 13 de abril, data da votação, não há dia em que não haja animação com diferentes candidaturas e muita gente a passar pelo local central de Bissau, em frente ao Palácio da Presidência.
Tal como dezenas de outros guineenses, ocupa o seu território a partir do fim da tarde e fica pela noite dentro, enquanto houver clientes prontos para esperar o tempo que for preciso em busca de brindes de campanha ou apenas ávidos em cantar a música de um qualquer candidato.
Os vendedores são tantos que Júlio Sambu, 35 anos, esquece o armazém que tem noutra ponta da cidade e usa uma carrinha como ponto de venda de bebidas para os fornecer com paletes de sumos e cerveja, estacionado na praça.
Abre a porta da bagageira e pendura-se na viatura ao lado da mercadoria. "Isto é melhor para ter o pão de cada dia", justifica, sem esconder outras ambições com que ainda hoje sonha.
"Eu queria era ser médico. Estudei até 2007, fiz o 11.º ano, mas depois não tive possibilidade de continuar", sem dinheiro que ali tenta amealhar para ele, a mulher e os dois filhos.
Seja qual for o desfecho, as eleições "são boas para o negócio", sublinha.
No seguimento, numa das cadeiras espalhadas pela Avenida Amílcar Cabral, Nucha da Silva dá voltas à canja num grande tacho aquecido com carvão, com que também prepara galinha cafriela, prato típico da Guiné-Bissau.
"O preço depende do bolso do cliente", refere, de olhos postos em mais um camião de caixa aberta com som estridente e repleto de gente em apoio a um candidato.
O ambiente de festa recheado de desabafos amargos surge este ano como prolongamento do Carnaval, altura em que Nucha começou a vender os primeiros comes e bebes a quem assistia aos desfiles.
Na hora de regressar a casa, o saldo serve de fraco consolo para quem compara as vendas com as de anos anteriores, garante Dico Costa, homem dos gelados desde 2002.
Desta vez até instalou uma tenda no centro da Praça dos Heróis Nacionais, mas nem os gelados a partir de 350 francos CFA (cerca de 55 cêntimos de euro) compõem a contabilidade: "não me recordo de ano pior".
As eleições gerais (presidenciais e legislativas) na Guiné-Bissau estão marcadas para 13 de abril e são as primeiras depois do golpe de Estado de abril de 2012.
O futuro passa por 13 candidatos presidenciais e 15 partidos concorrentes à Assembleia Nacional Popular, mas seja ele qual for, Júlio Sambu, tal como tantos outros guineenses, está preparado: "isto está difícil, mas já nos habituámos".
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