segunda-feira, 21 de junho de 2010

Cabo Verde-Chico Barros já deixou prisão de Conacry


Encontra-se livre em Bissau, desde o dia 10 de Maio passado, o cidadão cabo-verdiano, Francisco de Fátima Frederico Barros, de 42 anos, natural da Praia, depois de 10 meses preso em Guiné Conacry, para onde foi extraditado, em Setembro do ano passado, pelas autoridades militares da Guiné-Bissau, por alegada tentativa de Golpe de Estado naquele país vizinho.

Recorde-se, entretanto, que, Francisco Barros foi preso na capital guineense, no dia 10 de Agosto de 2009, por um grupo de militares guineenses, fortemente armado, a mando do responsável da Contra Inteligência Militar (CIM), o coronel Samba Djalô, sob alto patrocínio do Chefe de Estado Maior General das Forças Armadas (CEMGFA), Zamora Induta. De seguida, segundo Barros, foi levado para uma Base Aérea, onde esteve detido durante 21 dias, sem culpa formada, juntamente com os militares que terão participado na morte de João Bernardo "Nino" Vieira e Tagmé Na Waié, cujas investigações encontram-se sob alçada da justiça guineense.

De acordo com Chico, como é conhecido no seu círculo de amizade, ele estaria a organizar uma intentona militar, na fronteira com a Conacry, mas tudo não passava de uma farsa. "Depois de 10 meses de profunda amargura e, vivendo situações perfeitamente inumadas naquelas instalações prisionais em Conacry estou em condições de afirmar, categoricamente, que a prisão de 10 de Agosto, não passava de uma cabala, para denegrir a minha imagem e a do meu país, tendo como protagonistas os senhores Zamora Induta e Samba Djalô", garante Francisco Barros que, visivelmente emocionado não descarta a possibilidade de intentar uma acção contra o Estado da Guiné-Bissau, quer nacional, quer internacional, pelos danos morais e psíquicos causados por aquele barbárie.

Para aquele ex-presidiário da prisão de Conacry, está-se perante uma tamanha violação dos direitos humanos, pois nunca foi presente a nenhum tribunal para ser julgado e condenado, por alegada prática de um crime. Por isso, acha estranho e inconcebível, num Estado de Direito Democrático, que um cidadão estrangeiro, alegadamente, cometa um crime no país de acolhimento seja sequestrado e depois extraditado para outro país, sobretudo quando este viva em clima de instabilidade político-militar, como foi o caso da Guiné Conacry.

Liga dos Direitos Humanos condena o acto

Para a Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), na pessoa do seu porta-voz, Augusto Mário, o que aconteceu com o cabo-verdiano, Chico Barros é prova inequívoca, do nível de violação dos direitos humanos a que a Guiné-Bissau atingiu. "Nós só tomámos conhecimento um mês depois de extradição de Francisco Barros, quando a sua esposa dirigiu aos nossos serviços, para denunciar a barbárie que os militares tinham protagonizado através da busca à sua residência, pilhagens e roubos dos seus bens, sem o competente mandato do juiz", conta aquele responsável que é também jurista de profissão e que condena de forma veemente as atitudes dos militares. Por isso, continua aquele responsável, a LGDH considera que, independentemente, do que, aquele cidadão estrangeiro terá cometido, a extradição é, absolutamente, ilegal porque quem tem a competência para o fazer são as autoridades judiciárias, depois da competente instrução do processo-crime. Ainda assim, a LGDH accionou vários contactos junto dos seus congéneres internacionais, inclusive o da Guiné-Conacry que se prontificaram em ajudar na libertação do Chico, a 10 de Maio deste ano.

Recorde-se que Francisco Barros foi extraditado para aquele país vizinho da Guiné-Bissau, numa altura particularmente difícil entre a oposição e o regime militar liderado por Moussá Dadys Camará. De acordo com Barros, quando pisou o solo daquele país viveu momentos conturbados e de pânico pois pôde registar, da prisão onde se encontrava, trocas de tiros entre militares e a oposição, em plena rua, situação que resultou na morte de perto de uma centena de pessoas, muitas delas civis e inocentes. "Felizmente fui muito bem tratado na prisão em Conacry, porque muito cedo as autoridades daquele país perceberam que estava a ser alvo de uma cabala orquestrada pelas autoridades militares guineenses, com forte motivação política e pessoal", sublinha o nosso conterrâneo, residente em Bissau, acusando os militares guineenses de o tentar extorquir 70 mim euros em troca da sua libertação.

"Antes da minha extradição para Conacry nunca fui ouvido, sequer foi-me permitido constituir um advogado. Ao invés disso, pediram-me 70 mil euros em troca da minha liberdade. Sofri chantagens e perseguições dos militares, designadamente de Samba Djalô e de Zamora Induta que mandaram prender-me, na vã tentativa de obterem provas de um crime que nunca existiu", assevera Francisco Barros que acusa as duas altas patentes, na ocasião, de o tentarem extorquir dinheiro em troca da liberdade. Facto que só não aconteceu, segundo ele, porque recusou, terminantemente. Pois, Barros acreditava que estava totalmente inocente do crime que lhe era acusado.

"Foi feita a Justiça Divina"

Para aquele empresário cabo-verdiano, residente na capital guineense onde vive com a esposa e um filho de um ano e 10 meses, a primeira justiça já está feita. Trata-se pois, segundo Barros, da justiça Divina. É que, por ironia do destino ou não, os últimos acontecimentos de 1 de Abril na Guiné-Bissau, levaram a prisão de Zamora Induta e Samba Djalô, os dois verdadeiros protagonistas da sua prisão. "Sempre acreditei na minha inocência, embora estivesse à beira da morte, mas na companhia de Deus Nosso Senhor, uma Entidade que nunca deixei de evocar, em todos os momentos da minha angústia na prisão", revela.

Instado a pronunciar-se sobre, se não sente medo de deambular pelas ruas de Bissau, considerando as acusações que sobre ele impendem, Chico diz que quem não deve não teme. "Eu nunca cometi nenhum crime. Escolhi este país para investir, porque fui convidado pelo ex-presidente Nino Vieira, a quem eu era amigo pessoal, quando ainda vivia asilado em Portugal, para investir na Guiné-Bissau. Quando cá cheguei, em 2004, abri a empresa: Auto Volante - GB, SA, onde vendia viaturas e peças sobressalentes a vários serviços públicos e privados do país e da sub-região. Dava emprego a várias pessoas, fiz muitas amizades no seio da população guineense e por isso decide viver cá e constituir uma família", conta Francisco Barros, garantindo que não vai sair por agora de Bissau, a não ser para Cabo Verde, em 2012, onde pensa estabelecer-se definitivamente.

Garante que, para Cabo Verde tem um projecto interessante para a vida do país, no domínio do ambiente, em parceria com uma empresa estrangeira. Instado a falar sobre os pormenores do projecto, diz que se trata de um investimento muito importante, que iria contribuir para debelar a problemática do ambiente no país e que por isso gostava que fosse uma surpresa.

No final da conversa com o repórter, Chico Barros não conseguiu conter as lágrimas e espera que, através desta reportagem, os seus familiares de Lém Cachorro, na Praia, consigam encontrar algum conforto depois destes longos dez meses de odisseia, na prisão de Conacry.

Sem comentários:

Enviar um comentário